quinta-feira, 18 de agosto de 2011

RN perde a liderança em leilões.

O Rio Grande do Norte foi o estado com o menor número de projetos de geração de energia eólica emplacados no leilão federal realizado ontem, amargando um último lugar inédito num certame envolvendo essa fonte de energia e contrariando, com o desempenho, todas as expectativas dentro e fora do estado. O leilão foi o primeiro de dois programados pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para este mês. O segundo será realizado hoje. A queda nos preços durante a disputa ajudou a afugentar os investidores.
Ao todo, o RN habilitou 75 projetos de parques eólicos para os dois leilões - parques eólicos são aqueles que geram energia a partir do vento -  mas só conseguiu comercializar dois no primeiro dia de disputa, ficando atrás do Rio Grande do Sul (com 21), da Bahia, do Ceará, de Pernambuco e do Piauí, nesta ordem (veja todos os números no gráfico da página 2). Embora o número total de projetos que participaram no primeiro dia não tenha sido oficialmente divulgado ainda, a expectativa era que, já na largada, o estado assumisse a dianteira do processo, como aconteceu em 2009 e 2010, anos em que sagrou-se líder.

"Mas os investidores com projetos no RN estiveram menos dispostos a ser agressivos em relação ao preço", diz o ex-secretário estadual de Energia e atual diretor do Centro de Estratégias em Recursos Naturais e Energia, Jean-Paul Prates. Ele se refere ao fato de, nesse tipo de leilão, vencer quem oferecer a menor tarifa de venda aos compradores.

Ontem, com o preço-teto estipulado em R$ 139 por Megawatt/hora (Mwh), o leilão registrou uma queda considerada "violenta" no valor - no caso dos projetos do RN o valor oferecido pelo investidor ficou abaixo de R$ 99 MWh, 29,1%  menor que o inicial da disputa. A empresa responsável pelos dois empreendimentos é a Endesa, de origem espanhola. De forma geral, os preços das eólicas ficaram aquém das hidrelétricas (R$ 102 o Mwh), da biomassa (R$ 102,41 o Mwh) e do gás natural (R$ 106,26 o Mwh). 
Mas o valor da tarifa - que na visão de alguns investidores inviabiliza projetos se for muito baixo - é apenas o resultado da conta que pode explicar o desempenho do estado. Problemas como custos e entraves logísticos, que são nós existentes no RN, são pesados pelos empresários na hora de definir até que ponto podem baixar o valor na hora da disputa e estão entre os fatores que influenciam a decisão de ficar ou sair do certame. "Por alguma razão, empreendedores com projetos em outros estados arriscaram uma tarifa mais baixa. Mas esse realmente é um caso a se analisar", complementa Prates. Muitos dos fatores "pesados" nessa conta tem sido há meses motivo de queixa por parte dos investidores.

No modelo do leilão, entretanto, a queda nos preços é normal. A cada três minutos a Aneel reduz em R$ 0,50 o valor da tarifa. O número continua caindo até quando os participantes estiverem dispostos a dar novos lances.

Na disputa realizada ontem, os projetos de energia eólica concorreram com outros que têm como fonte gás natural e biomassa. Também houve participação do setor hidrelétrico. A Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) informou que o leilão negociou 285,509 milhões de MWh, movimentando R$ 29,14 bilhões. O preço médio final da licitação foi de R$ 102,07/MWh. Em entrevista coletiva concedida ao final do Leilão, o presidente da Empresa de Pesquisa Energética - EPE, Mauricio Tolmasquim, afirmou que o resultado do processo de contratação foi amplamente positivo, já que não houve o domínio de uma única fonte na composição final do mix de contratação. No leilão de hoje, em que apenas fontes de energia renovável participarão, o RN pode tentar obter mais sucesso. Mas os projetos que não são comercializados, segundo Prates, não se perdem. Geralmente são reconfigurados e aprimorados. Eles ficam na expectativa de uma nova chance  em outro leilão, que é importante por garantir mercado para a energia, considerando que os contratos de compra têm duração de cerca de 20 anos ou mais.

Possível queda no preço já gerava preocupação

Embora não seja considerada a principal causa do mal desempenho do Rio Grande do Norte no primeiro leilão de energia, a redução do 'preço-teto' da energia eólica já era apontada como motivo de preocupação pelos investidores, como publicou a Tribuna do Norte em  20 de julho. Para investidores como Dionísio Fernández Auray, CEO (espécie de diretor executivo) da Gestamp Wind, empresa que habilitou os 11 projetos inscritos nos dois leilões, produzir energia eólica no Brasil deixaria de ser atrativo, caso o preço médio do leilão ficasse muito abaixo do estipulado pela Empresa de Pesquisa Energética (Epe) - para o leilão A-3, o preço-teto da energia foi estipulado em R$ 139/MWh. Para o leilão de energia de reserva, em R$ 146/MWh. A empresa, que já conseguira aprovar sete projetos nos leilões anteriores, se mostrou preocupada com a queda gradual da tarifa. "O valor já está muito baixo. Se ficar ainda menor, ficará difícil construir parques eólicos", afirmou Dionísio Auray. Nenhum dos projetos da Gestamp previstos para o RN e habilitados para participar do primeiro leilão venceu.

A expectativa, segundo a Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), era que o preço final ficasse até 15% menor que o estipulado.  Uma redução ainda maior no preço final, na ótica do diretor executivo da Gestamp Wind, diminuiria a rentabilidade do negócio e afastaria algumas empresas. "Se ficar neste valor, há rentabilidade suficiente para executar os projetos. Se cair muito, empresas deixarão de participar do leilão. Isso porque não podemos aceitar um preço ruim , e sim, um preço justo", explicou Dionísio à Tribuna, na época. Contrariando as expectativas, a tarifa caiu 29,1% - quase o dobro - passando de  R$139/MWh para R$98,52/MWh, no RN.

Nos outros três leilões realizados em 2009 e 2010, o preço final sempre foi menor que o estipulado pela Empresa de Pesquisa Energética (Epe). Em 2009, por exemplo, o preço-teto foi R$189 MW/h. O preço médio do leilão, entretanto, ficou em R$ 148,39 MW/h (21,49% menor que o máximo estabelecido). Em 2010, o preço-teto foi R$167 MW/h. O preço médio do leilão, entretanto, ficou em R$ 122,69 MW/h (26,53% menor que o estabelecido).

O preço-teto serve de guia para os investidores. O modelo do leilão, cujas propostas partem sempre de um preço teto, força os valores para baixo, como explica a Abeeólica, entidade que representa o setor.

Expectativa era que RN repetisse liderança

Até antes do leilão, o Rio Grande do Norte liderava em número de projetos e oferta de energia no País. Pela terceira vez consecutiva, o estado foi líder em número de projetos eólicos habilitados a participar dos leilões de energia. Dos 240 projetos de parques eólicos habilitados em todo o país, 75 (31,25%) estavam no Rio Grande do Norte - estado que conseguira aprovar 64,6% dos projetos inscritos nos dois leilões. A oferta de energia no RN chegava a 1.989 MW - 32,86% do total habilitado. O Rio Grande do Sul, segundo colocado, respondia por 24% do total de energia eólica ofertada - oferta 27% menor que a apresentada pelo RN.

O RN também foi líder em número de projetos inscritos nos dois leilões de 2011. Do total de 429 projetos de parques eólicos inscritos nacionalmente para participar da disputa, 116, ou seja 27%, estavam previstos para serem construídos no estado.

A oferta de energia do RN chegava a 3.012 Megawatts (MW), representando 27,54% do total ofertado por todos os concorrentes.  A tendência, levando em consideração o bom desempenho do estado no setor, era de que o RN repetisse a façanha dos anos anteriores e liderasse mais uma vez o ranking de estados com maior números de projetos vencedores. "Quem tem mais projetos habilitados, tem mais chance de vencer", afirmou Jean Paul, em entrevista à Tribuna, em  9 de agosto. 

O que não ocorreu, ao menos, no primeiro leilão dos dois previstos para este ano. Benito Gama, secretário estadual de Desenvolvimento Econômico, havia optado por uma posição mais comedida. Segundo ele, era necessário esperar o leilão para ver se a posição do RN como líder se consolidava. "Leilão é leilão. Nunca se sabe o resultado".

Nenhum comentário: